JOÃO PAULO DA SILVA *
Embora a História oficial tenha documentado apenas um caso deste tipo de prática (no ano de 1829), reza a lenda que os piratas costumavam executar seus prisioneiros fazendo com que eles andassem sobre uma prancha até o encontro mortal com os tubarões. Se o método era uma forma recorrente ou não entre os corsários, pouco me importa neste momento. O que me interessa nessa história toda é a metáfora.
De tempos em tempos, o capitalismo é colocado para andar na prancha. Rebuliços econômicos, como este de agora, fazem parte de sua natureza paradoxal de produzir mais do que a sociedade pode consumir. A crise econômica é uma espécie de Frankenstein do capitalismo, responsável por agendar encontros periódicos entre o criador e a criatura. Quando isso acontece, os donos da festa vêem seus lucros diminuírem. E aí começa o pandemônio. Mas o fato dos capitalistas estarem andando na prancha não significa que, finalmente, eles vão nadar com os tubarões.
Demissões em massa, fechamento de empresas e redução de salários e direitos são algumas das formas encontradas pelo capitalismo para salvar a própria pele e retomar um novo período de lucros. É claro que o custo disso tudo é altíssimo, mas não tão alto para os magnatas. O aumento do desemprego, da fome, da miséria e da violência é sempre debitado na conta dos trabalhadores. Na história das crises do capitalismo, quem cria o problema não paga por ele. Faz os outros pagarem.
E pagar é realmente o termo que melhor se encaixa nessa tragédia toda. Desde que a turbulência econômica começou, o mundo já torrou trilhões na tentativa de salvar bancos e empresas de uma catástrofe maior. Detalhe: usando dinheiro público. Uma riqueza que não existe quando o assunto é aumentar os investimentos sociais. É incrível como esse pessoal sabe fazer mágica.
Nos últimos meses, executivos e governantes de muitos países vêm fazendo discursos efusivos, conclamando todos a se sacrificarem para tirar a economia mundial do buraco. Curioso: enquanto os bancos e as empresas estavam ganhando fortunas, ninguém chamou os trabalhadores para repartir o bolo. Agora, quando velhos fantasmas voltam a atormentar, eles aparecem com essa conversa de dividir os prejuízos.
Todos os dias o agravamento da crise faz o capitalismo andar um pouco mais sobre a prancha da História. Mas, para vê-lo realmente nadar com os tubarões, só falta mesmo alguém que dê um “empurrãozinho”.
(*) É jornalista
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